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Pseu de Outras Vezes

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04/12/2008 - Bastidores de mãe!

19/05/2008 - Na minha boca não!

18/03/2008 - O que nossas avós não contavam

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23/08/2007 - O catador de papelão e a marvada pinga: pros lados é que se vai!

18/06/2007 - Cães dóceis, vizinhos raivosos   

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05/03/2007 - Quem é a irmã bastarda?

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08/10/2006                            Bulímica é a madrasta!

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11/5/2005            Champanhe e literatura fraco da corda.

 

23/08/2007 - O catador de papelão e a marvada pinga: pros lados é que se vai! Por: Viviane Fuentes

Meu vizinho é um andarilho, mas não um andarilho qualquer, um trabalhador. Magrelo e musculoso, carrega um carrinho de madeira de duas rodas, cheio de papelão.

Como num ritual, ele começa logo cedo a labuta diária. O conheço há 6 anos, e cada brasileiro o conhece. 25 ou 50 anos? Não saberia dizer sua idade.

Pele flácida nos braços e enrugada no rosto devido à exposição à poluição das marginais e ao sol sem protetor solar - parece bacalhau na secura, porém com fibras mais escuras.

Não sei para onde leva o papelão e o lixo não mais usado pelos que vivem em casas de cimento, salubres, alugadas ou compradas - a dele foi adquirida.

Mas sei onde desova objetos pesados, como  ferramentas, de alto valor para ele: sua casa: uma carrocinha de madeira, recoberta de papelão e alumínio.

Sem rodas, sua residência não é móvel, fica numa rua sem muito fluxo de carros. Ele tem  esposa. Sem aliança, magrela e musculosa, negra, vaidosa e bem precavida.

Enquanto cambaleia ébrio, ela grita " Eu vi você olhando as negas!". É curioso a crise de ciúmes recorrente e intensa que tem pelo marido - de fora, não se dá nada por ele.

Antigamente, o ajudava a carregar a carroça e a catar o papelão. Hoje, mais asseada que antes, bem arrumada, cabelo, roupa, unha, parece ter arrumado trabalho registrado.

São visto juntos, morando juntos, dormindo juntos. O ciúme e a braveza dela continuam os mesmos. Gritando e, às vezes, o esbofeteando.

Ao contrário da genética da esposa, a pele do marido acelerou o processo de definhamento nos últimos meses, parece quase rasgada, mas ele mantém o ar dócil como o de um labrador.

Mas algo mudou. Antes tinha o olhar adiante, como um objetivo a caçar, a alcançar, não se fazia causar pena. Agora sua íris vaga, não tem prumo, não tem brio.

É visto embriagado com mais freqüência e novos amigos. Manhã ou noite ou dia. Em anos, nunca pediu dinheiro por levar os reciclados, mas recentemente isso mudou.

Precisa de moedas para pagar a pinga e convidar os amigos,  uma rodada de 51, Drurys ou rabo-de-galo. Para ter assunto e inflamar a discussão é preciso ter a dita, a marvada.

O álcool não lhe causa indigestão. Também qual será o outro prazer nessa vida? TV não tem. Sexo? Parece que muito - deve ser por isso a esposa é tão ciumenta - mas o quê mais?

Por que parar de beber seu formol existencial? Não faz sentido abdicar do prazer que a pinga proporciona. Optar a tragar a água filtrada que não tem em sua carroça, pra quê?

Ele é, certamente, um desses casos que nasceu do acaso, cachorro abandonado, no meio do mato e de uma grande ninhada - alguns morreram, outros sobreviveram.

Se vira como pode e não é violento ou amargo. Afinal qual é sua perspectiva de vida? Morrer e começar de novo. Ele é feliz? Por alguns instantes, parece que sim!

Nem sempre quem paga IPTU, precisa sair do país para, quando voltar do 1º Mundo, ter um grande choque. Não podemos ignorar, a felicidade não é plena para ninguém, existem lapsos de alegria.

Não temos que dar migalhas para quem nasceu em antro sem amor, sem comida, sem remédio, sem cosmético, produtos de higiene pessoal ou limpeza, e sim condições.

Auxiliar e proporcionar vitamina, gordura (boa ou ruim, a ruim ajuda no inverno), chão, teto, comida, lápis, papel, água. Condições de melhora, de mudança. Esperança. Tudo na medida certa, nem mais nem menos. E nada de esmola!

Comida, remédios, seguro de vida. Produtos de limpeza, cosméticos e um pouco de álcool não faz mal a ninguém - o brasileiro cambaleia, tomba, levanta e começa tudo outra vez.

Que venham condições mais dignas ao meu vizinho e que, em seu cotidiano pesado e difícil, nunca falte alegria, mulher, amigos e, é claro, um trago!

Não é aqui que pros lados é que se vai, nem pra frente nem pra trás? ...Vem-me aos ouvidos a voz de Inezita Barroso a cantar “A Marvada Pinga” e me estrebucho de rir: (FIM)

Marvada Pinga

Inezita Barroso/Composição: Ochelsis Laureano

 

Com a marvada pinga
É que eu me atrapaio
Eu entro na venda e já dou meu taio
Pego no copo e dali não saio
Ali memo eu bebo
Ali memo eu caio
Só pra carregar é que eu dô trabaio
Oi lá
Venho da cidade e ja venho cantando
Trago um garrafão que venho chupando
Venho pros caminho, venho tropicando, xifrando os barranco, venho cambetiando
E no lugar que eu caio já fico roncando
Oi lá
O marido me disse, ele me falou: "largue de beber, peço por favor"
Prosa de homem nunca dei valor
Bebo com o sol quente pra esfriar o calor
E bebo de noite é pra fazer suador
Cada vez que eu caio, caio diferente
Ameaço pra trás e caio pra frente, caio devagar, caio de repente, vo de corrupio, vo diretamente
Mas sendo de pinga, eu caio contente
Oi lá
Pego o garrafão e já balanceio que é pra mode vê se tá mesmo cheio
Não bebo de vez porque acho feio
No primeiro golpe chego até o meio
No segundo trago é que eu desvazeio
Oi lá
Eu bebo da pinga porque gosto dela
Eu bebo da branca, bebo da amarela
Bebo nos copo, bebo na tijela
Bebo temperada com cravo e canela
Seja qualquer tempo, vai pinga na guela
Ê marvada pinga!
Eu fui numa festa no Rio Tietê
Eu lá fui chegando no amanhecer
Já me deram pinga pra mim beber
Já me deram pinga pra mim beber e tava sem ferver
Eu bebi demais e fiquei mamada
Eu cai no chão e fiquei deitada
Ai eu fui pra casa de braço dado
Ai de braço dado, ai com dois soldados
Ai muito obrigado